Minas Gerais em Chamas

A face técnica (e política) das queimadas que dobraram no estado caixa d´água do Brasil
Caio A. Barroso Pereira & Raíra Saloméa - redacao@revistaecologico.com.br
Queimadas
Edição 145 - Publicado em: 31/08/2023

Estado rico em biodiversidade, Minas Gerais tem enfrentado um desafio crescente nos últimos anos: o aumento alarmante do número de queimadas. Dados recentes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) revelam números que lançam um alerta sobre a saúde dos ecossistemas e a preservação ambiental no Estado.


Os dados divulgados pelo INPE mostram o aumento do número de queimadas nos últimos oito anos. Na primeira gestão do governador Romeu Zema (NOVO), as queimadas mais do que dobraram em relação ao governo anterior, de Fernando Pimentel (PT). Ao todo, foram 730.625 focos ativos de 2019 a 2023, na gestão Zema. Enquanto no governo Pimentel, foram 341.799 focos identificados por satélite. Nos últimos três anos, o recorde de incêndios florestais em Minas ocorreu em 2021, com 24.279 ocorrências atendidas pelo Corpo de Bombeiros.


O bioma mais afetado pelas queimadas nos últimos oito anos é o Cerrado, com mais de 600 mil ocorrências no estado; seguido pelo bioma da Mata Atlântica, com mais de 400.674 registros de focos ativos. E a Caatinga, com 25.058 registros. O levantamento do Instituto Estadual de Florestas, órgão vinculado à Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), mostra que as regiões mais críticas do estado entre 2013 e 2021 foram Nordeste (1.050), Norte (945) e Triângulo Mineiro (840). Em 2022, a região Norte foi a que registrou mais focos, com mais de 1,3 mil alertas de incêndio.


Ainda em 2022, o governo Zema anunciou um investimento de 250 milhões de euros na prevenção e combate aos incêndios em 2023, um aumento 6,7% em relação a 2022. Em 2023, foi lançado o programa “Minas Contra o Fogo”, em parceria com 40 municípios do estado, para a prevenção e combate ao fogo. Ainda assim, a previsão é de que o número de focos de incêndio dobre até o fim de setembro, caso o ritmo de queimadas dos últimos 45 dias se mantenha.

Gavião com ferimentos sendo socorrido por brigadistas. (Crédito: AMDA)
Gavião com ferimentos sendo socorrido por brigadistas. (Crédito: AMDA)

O período de julho a outubro é o mais propenso à ocorrência de incêndios, concentrando mais de 80% das ocorrências. A chegada do El Niño no mês de julho torna o tempo mais seco e quente durante um longo período do ano. O cenário de alterações no clima e elevação das temperaturas, alertado pelo Painel de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (IPCC/ONU), já tem intensificado o trabalho dos órgãos de combate.

NA LINHA DE FRENTE DO FOGO


O Instituto Estadual de Florestas (IEF) é o órgão responsável pela prevenção de incêndios florestais. É ele quem realiza o planejamento, a coordenação e a promoção das ações. A linha de ação acontece assim: o IEF recebe o alerta de incêndio e aciona os comandos da PM e brigadas para os focos de incêndio.


O comando aéreo da Polícia Militar é um dos agentes de controle. Com helicóptero, eles se deslocam para as áreas com fogo e oferecem suporte logístico para brigadistas, mapeiam as áreas em chamas e utilizam o bambi bucket, uma espécie de balde ou bolsão pendurado, cheio de água usado para apagar as chamas.


O suporte aéreo é fundamental não só para levar brigadistas, que precisam percorrer longas distâncias durante as ocorrências, mas também para levar equipamentos, água, alimentos e materiais de higiene aos locais com focos ativos, em operações que podem durar horas ou até dias. E só do alto essa ajuda consegue chegar:


“O helicóptero consegue encurtar distâncias para chegada dos recursos. Ações que eles levariam até três horas entre veículos ou a pé, chegam em três minutos. Isso faz toda diferença em meio ao fogo.”, explica o Coronel Alexandre Miranda.


O comando aéreo apoia ações de combate em todo terrritório mineiro, apoiando também brigadistas voluntários no interior. Para o Coronel Alexandre, eles são indispensáveis no trabalho de combate. “Os brigadistas voluntários são diferenciados. Eles têm que ter um vigor físico, disposição e um psicológico muito fortes para fazer esse trabalho”.


O comando de Meio Ambiente da PM também está à frente do trabalho de combate. Os policiais fiscalizam áreas de risco na zona rural e orientam moradores sobre a prevenção de incêndios. As operações são realizadas sistematicamente pela corporação, porém o fator climático interfere no número de ocorrências.

Tatu fêmea grávida, morta  pelo fogo em Minas. (Crédito: AMDA)
Tatu fêmea grávida, morta pelo fogo em Minas. (Crédito: AMDA)

“Se nós temos um ano mais seco, com menos chuva, o número de registros é muito maior. E nós estamos passando por um período mais seco e com menos chuva, como tem sido divulgado. Consequentemente, a probabilidade de fogo aumenta e por mais tempo durante o ano precisamos ficar em alerta”, explica o Tenente Coronel Emiliano Lages, do batalhão de Meio Ambiente.

AMEAÇA À MINAS


Minas Gerais já registrou 9.182 queimadas de janeiro até 8 de agosto deste ano. Só nesse mês foram 812 incêndios florestais, uma média de mais de 100 ocorrências por dia. Julho foi o mês com mais registros até agora, com 3.046 chamados. Em Belo Horizonte, os Bombeiros já mapearam 626 áreas de vegetação com risco de incêndios. A tendência é que o número aumente até o fim do ano.

Filhote de veado é resgatado em área queimada  no Parque Estadual da Serra do Rola Moça. (Crédito: AMDA)
Filhote de veado é resgatado em área queimada no Parque Estadual da Serra do Rola Moça. (Crédito: AMDA)


Um dos incêndios de maior proporção em agosto ocorreu no Parque Nacional da Serra do Gandarela, em Raposos e Nova Lima, na Grande BH, unidade de conservação federal. Incêndios florestais estão entre as maiores ameaças às UC, especialmente entre julho e novembro.

A secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Marília Melo, ressalta o alerta para esse ano: “Sabemos que a queima é cíclica. Por termos registrado uma área menor queimada em 2022, sabemos que há mais substrato para queimar esse ano. Temos que ficar ainda mais atentos”, avaliou.

Incêndio na Serra da Moeda, na Região Metropolitana de BH. (Crédito: Miguel Burnier/AMDA)
Incêndio na Serra da Moeda, na Região Metropolitana de BH. (Crédito: Miguel Burnier/AMDA)

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